quinta-feira, 27 de março de 2014

É o petróleo!

Em junho do ano passado fiz um post falando sobre a política de subsídios aos combustíveis e como esta política poderia levar a uma série de problemas na economia, entre estes citei o impacto negativo na balança comercial. No post fiz referência a um texto do Marco Antonio Martins chamado Impasse onde ele criticava a aplicação desta mesma política na década de 1970 e explicava como os subsídios aos combustíveis estavam relacionados à crise externa da década de 1980. Em um resumo rápido o argumento é que ao não permitir que os consumidores recebam os sinais emitidos pelos preços dos combustíveis o governo induz a um consumo exagerado destes, como importamos combustíveis esse consumo exagerado acaba se refletindo em desequilíbrios comerciais. Não que déficits comerciais sejam um problema per si, mas um déficit causado por um desequilíbrio em um setor tão crítico como o de combustíveis pode ser sinal de sérios problemas no futuro. Pior ainda se o desequilibro é causado por uma política de governo, ou seja, é um desequilibro que não será corrigido pelos mecanismos de mercado pelo simples fato que o governo está deliberadamente impedindo o funcionamento desses mecanismos.

Pois bem, hoje li o Relatório de Inflação do Banco Central referente a março de 2014. Não tive como não reparar o box chamado Impacto da Conta Petróleo e Combustíveis sobre a Balança Comercial. O tal box constata o problema que eu tinha alertado no ano passado (na realidade venho apontando este problema desde bem antes, eu apenas não tinha o blog), outros economistas vinham alertando há muitos anos e que o Marco Antonio Martins alertou ainda na década de 1980! É espantosa a capacidade de nossos governantes de não aprender com os erros do passado e ainda acusar de alarmista, derrotista ou algum adjetivo semelhante os que apontam os erros que eles estão cometendo. Voltando ao box destaco o texto abaixo:

"No entanto, a maior parcela da elevação do deficitno comércio de Petróleo e combustíveis refletiu odescompasso entre oferta e demanda interna de petróleoe gás natural. Nesse sentido, conforme a Tabela 1,enquanto a produção nacional de petróleo em brutorecuou no biênio 2012-2013, o consumo interno depetróleo e derivados aumentou de modo significativo. Apropósito, cabe destacar que a dinâmica da produção emparte se explica pela perda de produtividade na extração epela intensificação de paradas técnicas para manutençãode plataformas; e a do consumo, pelos crescimentos dafrota de automóveis e do transporte de mercadorias, epelos preços da gasolina mais favoráveis ao consumidor,na comparação aos preços do etanol."

Perda de produtividade na extração, crescimento da frota de automóveis e finalmente a referência explícita aos preços da gasolina mais favoráveis aos consumidores. Nenhuma surpresa para quem conhece teoria econômica e acompanha a economia brasileira. Será que alguém no governo acreditava que o resultado seria diferente? Mais na frente o autor do box relaciona a questão energética com o déficit da conta petróleo, a incapacidade da oferta de energia de acompanhar a demanda forçou um uso ainda mais intenso das termelétricas e levou a uma maior necessidade de importação de gás. Novamente nenhuma surpresa. Quando o governo força um preço de um bem para baixo o consumo sobe muito e oferta não acompanha a subida, se o bem for imprescindível como é o caso do petróleo e da energia o excesso de demanda interna será suprida pelo exterior ou haverá racionamento. O experimento do governo subsidiando combustíveis mostra que esta regra vale mesmo quando o produtor é uma empresa controlada pelo próprio governo. Exatamente como aconteceu quando o mesmo experimento foi realizado pelo governo Geisel. Em números o resultado do experimento em 2013 foi um aumento de 19,3% das despesas com importação de combustíveis e um aumento da despesa com importação de gás natural de 37% em relação a 2012.
O box termina em um tom otimista mostrando a redução recente no déficit da conta petróleo e apontando fatores que podem levar a um aumento da produção. Não sei quanto da redução deste déficit decorre de manobras criativas, talvez ninguém saiba. Também não aposto no otimismo em relação ao aumento da produção. Porém é importante deixar claro que o desequilíbrio causado por subsídios é o grande problema, "resolver" o déficit forçando um aumento da produção nacional é mudar onde o desequilíbrio vai aparecer, afinal nunca é demais lembrar que os fatores de produção são escassos e deslocar capital e trabalho para atender uma demanda artificial pode levar a sérios problemas no longo prazo. Resolver o desequilíbrio entre custos e benefícios eliminando subsídios é a maneira mais simples, barata e eficiente de reduzir o ritmo da marcha para mais uma crise perfeitamente evitável.

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