quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

2016 - O ano em que voltamos a falar de reformas

A valer as previsões do Relatório Focus, divulgado pelo Banco Central, este ano vamos terminar em média 3,49% mais pobres do que começamos. Dois anos seguidos de queda do PIB era algo que não se via desde a década de 1930, não por acaso estamos assustados e preocupados com a economia. Porém eu arrisco dizer que, apesar dos números ruins de crescimento e emprego, 2016 pode ainda vir a ser lembrado como o ano em que começamos a tentar arrumar o desastre econômico que foi construído entre 2006 e 2015, vou além, se o governo tivesse forçado a barra para ter números melhores para crescimento e emprego ainda em 2016 eu estaria mais preocupado do que estou. De certa forma 2016 foi o tipo de ano em que quanto melhor, pior.

Para facilitar meu ponto será preciso fazer uma breve explicação da origem da crise, para uma explicação mais cuidadosa recomendo um post de 2015 chamado “Billie Jean“ (link aqui), um post de 2016 chamado “Sobre a dupla natureza da crise econômica” (link aqui) e um post de 2013 chamado “Oferta, Demanda e o Erro de Diagnóstico de 2011” (link aqui). Grosso modo a crise tem duas origens. A primeira e mais importante foi uma série de investimento ruins estimulados por políticas erradas, a partir de 2006 o governo resolveu tomar a liderança no processo de crescimento da economia e começou uma política de escolher empresas campeãs e setores que deveriam crescer. O resultado desta política foi uma série de investimento em projetos de baixo retorno ou sem retorno, uma má alocação de capital a nível macroeconômico. Na lista estão o Grupo X de Eike Batista, a Oi, os estaleiros construídos para “retomada da indústria naval”, o Comperj, a refinaria de Abreu Lima em Pernambuco, as refinarias prometidas para o Ceará e Maranhão, bem como obras gigantescas que nunca ficam prontas (ver link aqui), das quais destaco a transposição do rio São Francisco. Todo esse capital mal direcionado comprometeu a produtividade de nossa economia, que desde muito já não vinha bem, e criou a crise de médio e longo prazo. A outra origem da crise está nas políticas que o governo usou para minimizar os efeitos da crise de 2008 e criar a sensação que a guinada de 2006 estava dando resultados. Neste grupo está a redução forçada de juros que comprometeu a credibilidade do Banco Central, as operações de swap para influenciar o câmbio que pesaram na dívida pública e o adiamento do ajuste nos gastos que levou à crise fiscal.

Em 2015 o governo parece ter chegado ao limite das políticas que levaram à crise, na verdade já tinha ultrapassado tal limite, e precisou começar o processo de ajuste. Ocorre que, depois da campanha presidencial de 2014, era impossível para a presidente Dilma Roussef liderar um esforço de ajuste fiscal, aperto monetário e acabar com os instrumentos de direcionamento do investimento, ou seja, Dilma não tinha como liderar uma agenda que visava destruir tudo que ela tinha feito pelo menos desde 2005 quando derrotou a proposta de ajuste fiscal de longo prazo apresentado por Palocci, então ministro da Fazenda. Esta impossibilidade fez com que a crise econômica virasse uma crise política que culminou com o impeachment de Dilma e chegada ao poder de Michel Temer. O vice-presidente de Dilma, agora ocupando a presidência, sofre do mesmo mal que Dilma: venceu as eleições garantindo que não existia crise e que não havia necessidade de ajustes e mudanças de rumo e tem que governar fazendo o oposto do que prometeu na campanha. A situação de Temer é agravada por não ter o apoio da máquina petista que o considera traidor de Dilma e do PT e amenizada por não ter a mesma resistência das forças políticas e dos eleitores que se sentiram trapaceados em 2014.

Temer teve de escolher entre dois caminhos quando chegou ao poder. O primeiro seria tomar medidas de curto prazo para aliviar a crise, é o caminho das saídas fáceis, e o segundo seria apostar em medidas de médio e longo prazo para resolver os problemas criados nos últimos dez anos de governos petistas, é o caminho das reformas. Tivesse tomado o primeiro caminho, Temer estaria com melhores índices de popularidade, porém teria colocado o país em rota de uma crise ainda mais profunda que quase certamente viria acompanhada de taxas de inflação altas e crescentes, não falo de uma Venezuela, mas provavelmente teríamos tido uma inflação semelhante a observada na Argentina. Até agora tudo indica que Temer escolheu o segundo caminho, montou uma equipe econômica que impressiona qualquer observador que entenda do assunto e tem usado capital político para bancar as decisões da equipe liderada por Henrique Meirelles. A decisão de vetar a manobra de Rodrigo Maia, deputado do DEM do RJ que preside a Câmara, é um sinal forte do compromisso de Temer com as reformas.

Qualquer um que me acompanhe ou tenha prestado atenção nos parágrafos anteriores sabe que considero que o segundo caminho, o caminho das reformas, é o que eu considero correto. Infelizmente, apesar de correto, o caminho das reformas é longo e árduo, pior, é cheio de promessas de atalho que levam a lugar nenhum e oportunidades de retorno ao caminho das saídas fáceis. O grande desafio de Temer é não cair na tentação de pegar os atalhos e retornos. Assim como Thatcher, que até hoje é lembrada pelo “You turn if you want to. The lady's not for turning” em referência à possibilidade de retorno (U-turn), Temer terá de convencer que não fará retorno, até agora ele parece que vai conseguir.

A primeira grande medida de Temer foi aprovar a PEC do teto de gastos, com a provação a Constituição quase que obriga a aprovação de outras reformas que permitam o ajuste fiscal, destaque para a reforma da previdência. Na sequência Temer propôs as medidas de "Crescimento, Produtividade e Desburocratização", o fato de ligar crescimento à produtividade e desburocratização no lugar de investimento e valores específicos para preços como juros e câmbio ilustra o compromisso do governo com as reformas. Analisando as medidas (link aqui) é possível perceber a preocupação com a melhora do ambiente de negócios, fator que considero fundamental para o crescimento da produtividade. Como não poderia deixar de ser os retornos e os atalhos estão presentes nas medidas, especificamente no item oito que trata do BNDES e direciona crédito para micro, pequenas e médias empresas não sem antes definir que uma empresa com faturamento de R$ 300 milhões é uma média empresa. No lado monetário o Banco Central resistiu às pressões iniciais para reduzir juros, quando começou o processo de redução o compromisso do governo com o ajuste fiscal estava bem sinalizado e, mesmo assim, está fazendo a redução lentamente. O resultado é que mesmo com a queda de juros a inflação deve fechar o ano dentro do intervalo da meta, algo que era considerado impossível não faz muito tempo. Assim como no lado real é preciso tomar cuidado no lado monetário, os atalhos e retornos estão convidativos, mesmo dentro do intervalo da meta nossa inflação continua muito alta, um descuido do Banco Central pode comprometer todo o esforço dos últimos meses. É certo que a pressão por redução dos juros vai crescer nos próximos meses, mas o Banco Central já mostrou que resiste a pressões, melhor assim.

Salvo alguma surpresa, especialmente no ritmo de elevação de juros nos EUA, 2017 pode começar com um cenário fiscal mais promissor do que 2016, a inflação estará dento da meta, em 2016 foi de 10,6%, a taxa de juros caindo e o ambiente de negócios, principalmente na questão trabalhista, um pouquinho melhor. Então em 2017 a crise acaba? Creio que não, talvez lá pelo segundo semestre apareça algum crescimento, mas não é o crescimento que precisamos ou queremos. O estrago da década de contrarreformas, grosso modo de 2006 a 2015, foi grande, todo aquele capital mal direcionado ainda tem que ser recriado e/ou redirecionado, vários postos de trabalho e respectivas qualificações de mão de obra também terão de ser recriados e/ou redirecionados, um processo longo e penoso. Muitos servidores públicos foram contratados não necessariamente para os postos onde se fazia necessário contratar, o que significa mais um longo processo de ajuste.

Me parece justo dizer que 2016 foi o ano em que o governo voltou a falar seriamente de reformas para melhorar o ambiente de negócios, reformas para flexibilizar as relações de trabalho, reformas para melhorar a educação, reformas para controlar a questão previdenciária, reformas para permitir o ajuste fiscal e outras reformas importantes. Espero que 2017 seja o ano da volta definitiva das reformas e decrete o tardio fim da agenda de contrarreformas que durou uma década e pode ter nos tomado mais de duas décadas. Se assim for em 2018 o terreno estará favorável para que plantemos um crescimento saudável, um crescimento puxado pela oferta via aumento da produtividade. Se persistirmos no caminho das reformas e escaparmos dos cantos de sereia de aventureiros e da turma da contrarreforma nas eleições de 2018, na próxima década estaremos no caminho que abandonamos lá por 2006 e podemos ter um crescimento sustentado de longo prazo. Quase certamente Temer não estará no Planalto quando os frutos das reformas começarem a aparecer. Se tudo ser certo será um daqueles governantes que ajudaram a construir suas nações, mas foram repudiados quando no poder. Pode não ser uma boa perspectiva para um político profissional, mas é o suficiente para que eu diga que 2016, no que tange à economia, foi um ano melhor que 2015.




Um comentário:

  1. ¯\_(ツ)_/¯
    2017: a todos do blog, que fiquem atentos à picaretagem em 2017 & que vossas mentes permaneçam rápidas perante ao ilusionismo do PT.
    Um sublime 2017!

    Viva 2016!

    Em 2016 houve fato fabuloso sim, apesar de Vanessa Grazziotin falar que não, dessa forma equivocada assim:
    “O ano de 2016 é, sem dúvida, daqueles que dificilmente será esquecido. Ficará marcado na história pelos acontecimentos negativos ocorridos no Brasil e no mundo. Esse é o sentimento das pessoas”, diz Grazziotin.

    Mas, por outro lado, nem que seja apenas 1 fato positivo houve sim! É claro! Mesmo que seja, somente e só, um ato notável, de êxito. Extraordinário. Onde a sociedade se mostrou. Divino. Que ficará na história para sempre, para o início de um horizonte progressista do Brasil, na vida cultural, na artística, na esfera política, e na econômica.

    Que jamais será esquecido tal nascer dos anos a partir de 2016, apontando para frente. Ano em orientação à alta-cultura. Acontecimento esse verdadeiramente um marco histórico prodigioso. Tal ação acorrida em 2016 ocasionou o triunfo sobre a incompetência. Incrementando sim o Brasil em direção a modernidade, a reformas e mudanças positivas e progressistas. Enfim: admirável.

    Qual foi, afinal, essa ação sui-generis?
    Tal fato luminoso foi o:

    — «Tchau querida!»*

    [ (*) a «Coração Valente©» do João Santana; criada, estimulada e consumida. Uma espécie de Danoninho© ‘vale por um bifinho’. ATENÇÃO: eu disse Jo-ã-o SAN-TA-NA].

    Eis aí um momento progressista, no ano de 2016. Sem PeTê. Sem baranguice. Sem política kitsch.

    A volta de decoro ao Brasil. Basta de porralouquice.

    Feliz 2017 a todos.

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