domingo, 29 de janeiro de 2017

Curso de Macroeconomia Aplicada na UnB

Neste semestre vou ofertar uma disciplina de macroeconomia aplicada (o nome pode mudar) na UnB, a princípio a disciplina será ofertada apenas na graduação. Comecei a pensar a disciplina como uma forma de ensinar os alunos a procurar dados na internet, pegar os dados, colocar os dados em um formato legível por softwares de econometria e arrumar os dados de forma adequada para análises econômicas. Este ainda é o objetivo principal do curso, mas com o temo e conversas, resolvi colocar uma pequena revisão de concentos básicos de econometria (este não é um curso de econometria!) e também algumas aplicações. Inicialmente as aplicações consistiriam em replicar resultado de artigos importantes em macroeconomia. A estratégia não funcionou porque nos artigos mais antigos não encontrei as bases de dados usadas pelos autores, nos artigos mais recentes são usadas técnicas que nãos erá vistas neste curso. Desta forma as aplicações passaram a ser uma discussão sobre temas relevantes em macroeconomia aplicada e uma apresentação do modelo CAPM por conta de demanda dos alunos. Da ideia original de replicar artigos sobrou apenas Mankiw, Romer e Weill (1992). No futuro tentarei resolver este problema.

O arquivo com as notas de aula está aqui. Ainda estou organizando as bases de dados e procurando um lugar de fácil acesso para que os alunos possam reproduzir os exemplos das notas de aula, se bem que várias de nossas bases são modificações de bases de dados públicas como as do FMI, Banco Mundial e Penn Wolrd Table e estas modificações são explicadas nas notas de aula. Espero feedback dos alunos desta primeira turma e de leitores pelo Brasil que não farão o curso, mas acreditem que possam melhorar o material. Nos vemos em março.


P.S. A figura acima foi criada com o R a partir de imagens de satélite, que saber como? É só fazer o curso.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Ainda sobre o IPCA de 2016... O ano em que voltou a ser permitido ser pessimista sem ser acusado de terrorista econômico.

Nos últimos anos ficou comum ver certos jornalistas, políticos e membros da equipe econômica do governo de plantão atacando economistas que faziam previsões que desagradavam o governo, a pancada era ainda mais forte nos jornalistas que divulgavam tais previsões. Quem desafiava o ridículo otimismo do governo ganhava títulos como terrorista econômico, inimigo dos pobres, inimigo do estado, serviçal da banca ou piadista. Em um dos pontos mais absurdos da perseguição chegaram a ensaiar a tese estapafúrdia que economistas forçavam a expectativa de inflação para cima como forma de forçar o aumento dos juros, em um dos pontos mais patéticos criaram a figura do pessimildo.

O curioso é que no governo Dilma, auge da perseguição a quem contrariava o governo, o mercado via de regra era otimista com a inflação, no sentido que a regra era o mercado prever uma inflação menor que a inflação que acontecia. Para ilustrar esse fato a figura abaixo mostra a expectativa de inflação mês a mês conforme o último relatório de cada mês e a inflação que de fato aconteceu no ano (reta verde).



Repare que durante praticamente todo o ano de 2011, todo o ano de 2012, todo o ano de 2013, a maior parte do ano de 2014 e praticamente todo o ano de 2015 a previsão de inflação do mercado estava abaixo da inflação que realmente ocorreu, ou seja, o mercado foi otimista. O único ano em que o mercado errou para cima durante todo o ano foi em 2016.

Não acuso o mercado, longe disso, afinal eu também estou entre os que acreditavam que a inflação seria maior do que a que ocorreu de fato. É fácil de entender que dada a mudança de política os modelos tenham errado para mais, o que significa que a dificilmente a inflação abaixo da esperada pode ser explicada apenas pela recessão ou pelo câmbio, variáveis que devem estar nos modelos de previsão da turma do mercado. O que não é fácil de entender e que eu não pretendo esquecer nem perdoar é a razão de tanta perseguição a profissionais que de uma forma ou outra por desagradavam o governo por fazer previsões que, ainda que otimistas, não agradavam os devaneios do antigo governo e seu partido. Enfim, é bom viver novamente em um país onde errar uma previsão ou mesmo ser pessimista não transforma alguém em alvo da corte.



IPCA de 2016 fica dentro da meta e deixa claro o efeito da mudança na equipe econômica.

A inflação medida pelo IPCA terminou o ano dentro do intervalo da meta (link aqui), mesmo sabendo que nossa meta é alta e que uma inflação de 6,29% ainda é muito alta temos motivos para comemorar, afinal, contrariando as expectativas do mercado e minhas, o Banco Central conseguiu que a inflação ficasse abaixo do teto da meta ainda em 2016. Ilan Goldfajn tomou posse como presidente do Banco Central em nove de junho indicado por um governo que só saiu da condição de interino em trinta e um de agosto. A figura abaixo mostra como a chegada de Goldfajn e equipe mudou a trajetória da inflação.




Na figura estão os valores do IPCA de cada mês nos anos de 2011 a 2016. Repare que em todos os anos de 2011 a 2015 o IPCA cai até a metade do ano e sobe a partir deste período, o padrão está relacionado a sazonalidade de alguns preços e não é um problema em si. Tivesse o IPCA de 2016 seguido este padrão a inflação teria terminado o ano acima do teto da meta, talvez não tão alta quanto os 10,6% de 2015, mas superior a 7% como estava previsto no Relatório Focus divulgado pelo Banco Central. Porém, com a mudança nas expectativas por conta do governo e da chegada de uma nova equipe no Banco Central, foi possível fazer com que a inflação mudasse de trajetória de forma que, ao contrário de todos os outros anos entre 2011 e 2015, o IPCA não começou uma trajetória de alta depois do meio do ano. A figura abaixo mostra o comportamento do IPCA em 2016 e a média das medidas mensais do IPCA entre 2011 e 2015.




A mudança de comportamento fica clara. De fato, a partir de setembro de 2016, com o novo governo já sem a condição de interino, o IPCA ficou bem abaixo da média dos anos anteriores em todos os meses. Cabe ressaltar que essa mudança de trajetória da inflação, junto com as medidas fiscais que a Fazenda está tomando, possibilitou a redução da taxa de juros sem ocorrer um desastre semelhante ao do passado recente. Na condição de pessimista inveterado, enquanto houver inflação vou continuar reclamando e cobrando do Banco central que a mantenha controlada. Porém, se tinha alguém perguntando se alguma coisa melhorou depois da saída de Dilma, está aí uma resposta.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Não é exatamente por malandragem, é por baixa produtividade.

É comum encontrar explicações para nosso baixo PIB per capita que partem da ideia que brasileiro trabalha pouco, ou seja, não somos ricos por sermos malandros. Parte dessa ideia deve vir da simpatia que temos com os malandros, embora pareça que tal simpatia está diminuindo nos últimos anos. Veja o Rio de Janeiro, a cidade que serviu de cenário para a Ópera do Malandro e para os filmes do Hugo Carvana, hoje tem como prefeito um pastor evangélico fazendo parecer que a ética protestante chegou do lado de baixo do equador. Apesar disso a imagem do brasileiro malandro persiste. Nem mesmo trabalhando, morando lá longe e chacoalhando num trem da Central, dizem as más línguas, conseguimos perder a fama de malandros, talvez por culpa dos malandros com aparato de malandro oficial.

Para checar se nossa suposta malandragem pode ser a causa de não sermos um país rico resolvi dar uma olhada nos dados da PWT 9.0 (link aqui). Nesta versão da PWT constam dados de horas médias trabalhadas para alguns países. Selecionei o período entre 2010 e 2014, últimos cinco anos disponíveis, e o PIB, a população, as horas trabalhadas médias e a população ocupada, eliminando os países sem esses dados disponíveis fiquei com 68 países. O primeiro exercício foi comparar as horas médias trabalhadas no Brasil com as de outros países. Ficamos abaixo da média, mas não ficamos entre os que menos trabalham. Segundo a PWT 9.0 no Brasil cada pessoa empregada trabalha em média 1.723 horas por ano, a média do mundo 1.875, a mediana é 1.846 e o primeiro quartil é 1.686, ou seja, se dividirmos os países em quatro grupos onde o primeiro é o dos países que menos trabalham e o quarto é o dos países que mais trabalham estaremos no segundo grupo. A figura abaixo compara as horas trabalhadas médias no Brasil e nos grupos de países conforme a classificação do FMI.




Observando a figura vemos que nossas horas trabalhadas médias são menores que as do grupo América Latina e Caribe, na verdade são menores do que a de qualquer grupo de países que escolhamos. O grupo com a média mais próxima da nossa é o de países avançados, alguém pode dizer que somos pobres querendo trabalhar como ricos, mas não vou nesse caminho. Meu questionamento vai na direção oposta, quero analisar como é possível que países ricos trabalhem menos que os países do Sub-Saara ou que os países emergentes da Ásia. Se somos pobres porque não trabalhamos, qual a razão de alemães, holandeses, noruegueses e dinamarqueses trabalharem em média menos que nós e mesmo assim possuírem uma renda muito maior que a nossa? Será que trabalhar mais não implica em ser mais rico?

A figura abaixo mostra a relação entre horas trabalhadas médias e PIB per capita, como podem ver a relação é negativa, ou seja, em média, nos países mais ricos os trabalhadores dedicam menos horas por ano a seus empregos. O resultado pode parecer estranho, se trabalham menos deveriam produzir menos e, logo, ter menos renda. Porém existe um outro efeito importante. Lazer definitivamente não é um bem inferior, ou seja, quanto maior a renda de uma pessoa, mais lazer a pessoa quer desfrutar. Sendo assim faz sentido pensar que em países ricos os trabalhadores demandam mais lazer e, por isso, trabalham menos. É como dizer que eles trabalham pouco porque podem.



Podemos ser mais cuidadosos em nossa análise. Considere uma família de quatro pessoas que tem uma única pessoa trabalhando 60 horas por semana e uma outra família de quatro pessoas onde tem duas pessoas trabalhando 40 horas por semana. Se olharmos as horas trabalhadas médias por pessoa empregada em cada família vamos dizer que a primeira família tem 60h horas trabalhadas médias e a segunda família tem 40h trabalhadas médias. Se olharmos totais trabalhadas a primeira família trabalha 60h e a segunda família trabalha 80h, sendo assim seria razoável que mesmo com menos horas trabalhadas médias a segunda família tenha maior renda, afinal a segunda família trabalha mais. O raciocínio pode ser repetido em termos per capita, ou seja, por membros da família. Na primeira família cada membro trabalha, em média, 15h e na segunda família cada membro trabalha, em média, 20h, logo as horas trabalhadas per capita na segunda família também são maiores que a horas trabalhadas per capita na segunda família.

Para abordar esta questão vamos calcular as horas trabalhadas per capita dos países da amostra e comparar com a renda per capita. A figura abaixo faz isso, repare que a linha é quase horizontal, ou seja, quase não existe relação entre horas trabalhadas per capita e PIB per capita (para os curiosos o p-value da regressão entre PIB per capita e horas trabalhadas per capita é 0,77). Repare que as horas trabalhadas per capita no Brasil são maiores que as de países como Chile, Estados Unidos, Suécia e Alemanha. De fato, no Brasil trabalhamos 88r per capita, a média da amostra é 851h e a mediana é 804h. Isso em parte se deve ao chamado bônus demográfico, ou seja, a “família” brasileira tem muita gente trabalhando porque a soma de velhos de crianças não é tão alta quanto em outros países. Outra parte é devido a não sermos ricos, em países ricos as famílias podem esperar mais antes de mandar os filhos para o mercado de trabalho.




Vimos que os trabalhadores nos países ricos não trabalham em média mais horas que o dos países pobres, também vimos que as horas trabalhadas por pessoa não tem muita influência no PIB per capita. Então por que os países ricos são ricos? Por que são produtivos! A verdade é que existe uma diferença significativa entre trabalhar muito e trabalhar bem, dito de outra forma, esforço não é eficiência. As horas trabalhadas a menos nos países ricos são mais que compensadas pela maior produtividade do trabalho nesses países. A figura abaixo mostra a produtividade do trabalho e as horas trabalhadas per capita.




A relação levemente negativa pode ser explicada por conta de trabalhadores de países menos produtivos terem de trabalhar mais para conseguir melhorar a renda. Chama atenção no gráfico a dominância dos países avançados na parte de cima da linha, isso ajuda muito a explica por que países ricos são ricos mesmo trabalhando menos. A guisa de exemplo considere Brasil e Alemanha. O trabalhador alemão trabalha em média 1.378h por ano enquanto o trabalhador brasileiro trabalha e média 1.723 h por ano, ou seja, um trabalhador brasileiro passa 25% mais tempo trabalhando que um alemão. Se considerarmos a horas trabalhadas per capita veremos que na Alemanha são 710h por pessoa por ano, no Brasil 886h por pessoa por ano, ou seja, aqui é 24,8% maior que lá. Por outro lado, na Alemanha um trabalhador produz $61,5 por hora de trabalho, no Brasil um trabalhador produz $16,4 por hora de trabalho, ou seja, a produtividade lá é 3,75 vezes a produtividade de cá. Com tanta produtividade é possível trabalhar menos e ter um PIB per capita de $43,7 mil contra nossos $14,6 mil.

Uma figura com PIB per capita e produtividade do trabalho pode ser questionável por vários motivos, mas aqui no blog será útil para ilustrar o argumento do post e para permitir uma provocação final. A figura abaixo mostra a produtividade do trabalho e o PIB per capita, reparem bem nela:




Nossa baixa produtividade faz com que mereçamos ser um país com renda per capita abaixo da média!


segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Poupança, Investimento... e Juros

É quase um consenso entre economistas, empresários, governantes e outros que se interessam pelas questões relacionadas à economia brasileira que temos uma baixa taxa de investimento. É difícil ler a seção de economia de um jornal sem esbarrar em algum empresário dizendo que o investimento é baixo por conta das altas taxas de juros, mais difícil ainda é encontrar alguém que tente explicar a razão de que mesmo com uma taxa de juros alta os brasileiros demandam mais capital do que ofertam, ou seja, nossa taxa de investimento, que expressa a demanda por capital, é maior que nossa taxa de poupança, que expressa nossa oferta de capital. Sendo os juros no Brasil tão altos e sendo os juros o “prêmio” por poupar era de se esperar que nossa taxa de poupança fosse alta. Alguém pode tentar argumentar que nossa taxa de poupança é baixa porque somos um povo muito impaciente de forma que nem com juros altos nos dispomos a poupar, é um caminho, porém uma das implicações desse argumento é que a taxa de juros no Brasil é baixa!

Como assim? Explico. Se a taxa de juros é o que se ganha por esperar um tempo para gastar o próprio dinheiro e nós somos muito impacientes é natural que a taxa de juros por aqui seja alta. Mas a taxa de juros já é alta! Por que deveria ser mais alta? Calma, não disse bem isso, disse que se ficarmos apenas com o argumento da impaciência então nossa taxa de juros devia ser mais alta. Isso é verdade porque, usando esse argumento, a taxa de juros deveria equilibrar a oferta de capital, ou seja, a poupança e a demanda por capital, ou seja, o investimento. Como mostra a figura abaixo a taxa de investimento no Brasil costuma ser maior do que a taxa de poupança, logo para equilibrar poupança e investimento a taxa de juros deveria subir.




A diferença entre a taxa de investimento e a taxa de poupança é financiada via poupança externa, ou seja, temos que “importar” capital para compensar nosso excesso de demanda por capital. O acúmulo de poupança externa, nome que se dá ao capital importado que chega a cada período, se torna dívida externa, uma variável que costuma tirar o sono de alguns economistas, especialmente a turma de esquerda. A dívida externa, como qualquer dívida, não é boa nem má em si, tudo depende que será feito com o capital. Se for usada em projetos com retorno alto o suficiente para pagar os juros e a dívida contraída a poupança externa fez um bem ao país, do contrário é mais complicado, mas é justo dizer que o país terá de buscar outra forma de pagar a dívida que contraiu para financiar o projeto ruim. Porém a dívida externa, que decorre da poupança externa, tem um complicador, trata-se do câmbio.

Quem me acompanha sabe que considero a fixação de economistas desenvolvimentistas com a taxa de câmbio um exagero desnecessário, na melhor das hipóteses, ou uma forma marota de justificar transferências de renda para indústria, hipótese que considero mais realista. É aí que aparece o complicador da poupança externa, se as empresas estão endividadas em moeda externa e nossa moeda é desvalorizada isso pode trazer sérios prejuízos para as empresas. Na realidade, parte dos problemas de endividamento que nossas empresas enfrentam começaram na grande desvalorização cambial dos últimos anos. Para economistas como eu uma dívida em dólares significa que a empresa tem mais uma variável para considerar quando for pegar empréstimos, para economistas que acreditam que a constante desvalorização do câmbio é o caminho para o crescimento, empresas endividadas em dólares são um pesadelo.

Como o leitor pode ver a coisa não é simples. Se não temos poupança interna para financiar nosso investimento o caminho é pegar poupança externa. O uso de poupança externa faz com que as empresas nacionais tenham de fazer seguros contra desvalorização cambial ou as coloca em posição de risco por conta de flutuações no câmbio, nos dois casos há um aumento no custo do capital. Uma maneira de acomodar o problema é o governo se financiar no exterior liberando o capital local para as empresas, para fazer isso o governo terá de elevar as taxas de juros que paga em seus títulos. A medida tem um efeito colateral de valorizar nossa moeda e facilitar a vida das empresas endividadas em dólares, mas usar esse caminho passa por aumento de juros o que reforça a tese que os juros brasileiros são baixos e precisam subir. Como não vou defender esta tese, sou um rapaz ajuizado, prefiro pensar na poupança interna.

Antes de pensar em elevar a poupança interna vale checar se nossa poupança é mesmo baixa. Para fazer isso peguei a base de dados do FMI atualizada em outubro de 2016 (link aqui), selecionei os anos entre 2006 e 2016, tomei as médias da população, taxa de investimento, taxa de poupança, dívida como proporção do PIB e PIB per capita corrigido por paridade de poder compra e finalmente excluí os países com menos de cinco milhões de habitantes na média do período. A figura abaixo mostra a taxa de poupança média em vários grupos de países, a taxa de poupança do Brasil, que foi de 18,2%, está destacada na figura. Repare que nossa taxa de poupança foi menor que a média dos países avançados, da comunidade de países independentes, dos países emergentes da Ásia e da América Latina e Caribe. Ficamos acima da média dos países emergentes da Europa e do Sub-Saara, essa última região apresenta problemas nos dados, por exemplo três países com taxas de poupança negativas, e será retirada das próximas figuras.




A figura com grupos facilita a comparação entre o Brasil e outros países, porém, omite informações que podem ser importantes. A próxima figura mostra a relação entre taxa de poupança em PIB per capita em todos os países da amostra excluídos os países do Sub-Saara. É fácil ver que a relação entre taxa de poupança de PIB per capita é positiva (é sempre útil lembrar que correlação não é causalidade), da mesma forma é fácil ver que o Brasil está abaixo da reta e abaixo do intervalo de confiança em volta da reta, ou seja, se considerarmos apenas o PIB per capita, não estou dizendo que isso é uma boa hipótese, a taxa de poupança no Brasil é mais baixa do que deveria ser. Destaquei na figura ao China, a Índia, a Rússia, o México e o Chile, os três primeiros por fazer parte dos BRICS (alguém ainda fala de BRICS?), o Chile por ser o país de referência na América Latina e o México por ser um país populoso e com o PIB grande como o Brasil. Nossa taxa de poupança é menor que a de todos os países em destaque.




Creio que neste ponto é justo dizer que a taxa de poupança no Brasil é baixa, falta saber a razão. O primeiro suspeito, a renda per capita, pode ajudar a explicar, mas não resolve o problema, como vimos nossa taxa de poupança é baixa quando comparada a taxa de poupança de países com renda per capita próximas à nossa. Uma segunda alternativa é o tamanho do governo, um governo grande pode levar à redução da poupança por ofertar seguros que substituem a poupança, voltarei a esse tema mais tarde, ou por reduzir a renda disponível das famílias. Aqui foi preciso um certo cuidado, usar o gasto público como medida do tamanho do governo é tentador, mas pode não ser adequado, a poupança de um país é a soma da poupança privada e da poupança do governo, esta última é dada pela diferença entre a renda e o consumo do governo e esse último é parte do gasto do governo. Para fugir deste problema usei o tamanho da dívida pública como medida de tamanho do governo, fiz com o gasto para checar e o resultado não muda muito, a figura abaixo mostra a relação entre taxa de poupança e dívida pública, o tamanho das bolinhas significa o PIB per capita, quanto maior a bolinha maior o PIB per capita.




A relação é negativa, ou seja, quanto maior a dívida pública como proporção do PIB menor a taxa de poupança, um resultado que não me deixou surpreso. Repare que novamente o Brasil fica abaixo da reta e abaixo do intervalo de confiança. O resultado sugere que, assim como o PIB per capita, a dívida pública ajuda a explicar nossa baixa taxa de poupança, mas não resolve o problema. Não é difícil tentar somar os efeitos do PIB per capita e da dívida pública ou até mesmo colocar outras variáveis, mas isso sairia do espírito do blog de apresentar as questões de forma simples para qualquer um que não tenha aversão a gráficos. Me contento em alertar ao leitor que o problema da baixa poupança no Brasil, que foi tratado no blog aqui e aqui, pode ser mais complicado do que parece. Como provocação deixo a sugestão que nossa baixa poupança pode estar relacionada ao nosso estado de bem-estar social, ao fornecer seguros que substituem a necessidade de poupar estados de bem-estar social tiram um importante incentivo à poupança, mas isso é conversa para outro post.